sábado, 18 de novembro de 2023

Poema Quotidiano

É tão depressa noite neste bairro Nenhum outro porém senhor administrador goza de tão eficiente serviço de sol Ainda não há muito ele parecia domiciliado e residente ao fim da rua O senhor não calcula todo o dia que festa de luz proporcionou a todos Nunca vi e já tenho os meus anos lavar a gente as mãos no sol como hoje Donas de casa vieram encher de sol cântaros alguidares e mais vasos domésticos Nunca em tantos pés assim humildemente brilhou Orientou diz-se até os olhos das crianças para a escola e pôs reflexos novos nas míseras vidraças lá do fundo Há quem diga que o sol foi longe demais Algum dos pobres desta freguesia apanhou-o na faca misturou-o no pão Chegaram a tratá-lo por vizinho Por este andar... Foi uma autêntica loucura O astro-rei tornado acessível a todos ele que ninguém habitualmente saudava Sempre o mesmo indiferente espectáculo de luz sobre os nossos cuidados Íamos vínhamos entrávamos não víamos aquela persistência rubra. Ousaria alguém deixar um só daqueles raios atravessar-lhe a vida iluminar-lhe as penas? Mas hoje o sol morreu como qualquer de nós Ficou tão triste a gente destes sítios Nunca foi tão depressa noite neste bairro Ruy Belo, in "Aquele Grande Rio Eufrates"

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